O Natal desperta um tempo suspenso, adormecido, em que a febril actividade humana é alvo de súbita paragem e momentânea pausa. Com o frio lá fora, ao lume da lareira antiga, os homens dão tréguas a si próprios e ao vazio trepidante em que vivem. Durante uns dias, ou um par de horas, o ritmo abranda, no convívio festivo com os entes mais queridos ou próximos. A alegria transbordante aparece sempre, seja de forma real ou simulada, serena ou ruidosa. Suspendem-se os conflitos e as inimizades, pensa-se nos que estão distantes e sós, tudo nos serve de pretexto para a dolorosa memória de natais pretéritos, os da meninice — e para a saudade dos que já partiram. A trégua de Natal de 1914, quando espontaneamente, dos dois lados das trincheiras, os soldados alemães e britânicos decidiram largar as armas e, em vez de tiros, trocar entre si saudações festivas, cânticos natalícios — e até presentes! — comprova o poder apelativo da Noite Santa, a sua enorme força simbólica.